Análise do atual cenário político para a educação: há motivo para pânico?

Se você se aproximar de qualquer roda de conversas em ambientes universitários perceberá que o assunto é o mesmo: o segundo turno das eleições de 2018. Nesta, o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, desponta como o franco favorito para chegar pela primeira vez à Presidência da República; enquanto que o candidato do PT, Fernando Haddad, sob as bençãos do presidiário Lula, ameniza seu discurso ideológico e repagina sua imagem a fim de conquistar uma verdadeira legião de eleitores indecisos para talvez, recuperar uma diferença de cerca de 18 milhões de votos.

Com tal cenário desenhado, o que mais me causa espécie é o clima de pavor vivenciado nas universidades, uma  verdadeira histeria coletiva reverberada por professores e alunos – temerosos com o advento do capitão da reserva e de um possível retorno dos militares ao poder. Os motivos alegados são diversos mas, em relação à educação, envolvem desde o receio da privatização das universidades públicas, supostos cortes de recursos destinados a programas de pesquisa e paralisia de concursos públicos e até o temor do fechamento de unidades. Ora, resta evidente que grande parte dessas alegações não representa a realidade e, na verdade, pode ser vista como estridores de indivíduos que apenas ressoam convicções pessoais com mera finalidade política.

Mas há razão para pânico? Ora, pelo menos para o item educação (outros tópicos podem ser observados por aí), a resposta é não. Na verdade, ambos os planos de governo dos candidatos à presidência de um país que se encontra nas últimas posições em  testes de educação no mundo são vagos. Bolsonaro, na verdade,  insinua mexer no vespeiro. Embora tenha a intenção de criar escolas militares em capitais, que ao meu ver são ações inócuas a fim de ressaltar a importância da ordem e disciplina, as demais medidas podem até apresentar certa relevância.

Uma delas é devolver o mérito acadêmico e o ensino técnico em detrimento da doutrinação ideológica. Infelizmente, é fato público e notório que vários professores emprestaram sua reputação para militar em sala-de-aula. Como isso seria acessado é a pergunta de um milhão de dólares… Além disso, os tópicos relacionados à ideologia de gênero que se encontram escondidos na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) também seriam retirados, assim como a aprovação automática dos alunos seria revista.

O fomento de cursos técnicos e superiores, com foco no empreendedorismo, é extremamente louvável e oportuno.  Pode-se perceber que vários cursos universitários não preparam devidamente os recém-graduados para o mercado de trabalho. Haveria maior investimento em ciência e tecnologia e as pesquisas seriam incentivadas a focar numa atuação conjunta com empresas, de modo que especificidades regionais sejam observadas. Ainda, a integração do ensino fundamental, médio e superior proporcionaria uma visão estratégica do cenário educacional, e permitiria uma contínua capacitação dos professores e gestores a fim de “detectar e corrigir as falhas no processo de formação dos alunos”.

Os temas supracitados representam os principais pontos direcionados à educação por Jair Bolsonaro. Apesar de ser pouco detalhado, nada do que foi disposto em seu plano de governo é motivo para medo e pânico. Porém, entende-se que, caso seja eleito, qualquer mudança traga certa apreensão. Trata-se de mais uma situação que pode ser perfeitamente exemplificada pelo mito da caverna de Platão. Nesta alegoria, o grande filósofo de “A República” descreve a história de prisioneiros que desde o nascimento foram acorrentados em uma fria e escura caverna. Voltados para o final desta, tendo a parede iluminada por uma fogueira acesa e cercados por um muro baixo ao fundo; não podiam perceber as pessoas que por ali passavam e transportavam coisas diversas. Somente eram capazes de observar os sons e as imagens  distorcidas que eram projetadas na parede da caverna. Esta, na verdade, seria a representação do cotidiano e conhecimento imutável dos indivíduos. Se por acaso, um desses prisioneiros escapasse de suas amarras e conhecesse a  verdadeira realidade ao sair da caverna, vivenciaria experiências desconfortáveis como a própria sensibilidade à luz e a adaptação a um novo mundo. Se então retornasse à caverna para descrever as boas novas aos colegas, a realidade seria muito penosa e possivelmente o novo homem sofreria deboche de seus companheiros; e seria, portanto, tratado como um louco. Aturdido então com essa dicotomia, poderia retornar ao “conforto” da caverna, talvez isso já não seria o suficiente…

caverna

O fato é que os pré-conceitos, o senso comum e o receio pela busca da verdade contaminaram a discussão política e interditaram o debate técnico, aflorando sentimentos diversos, muitos dos quais considerados grotescos e até mesmo pueris. Como diria Theodore Dalrymple,  “o culto do sentimento destrói a capacidade de pensar, e até a consciência do que é necessário pensar”. É o momento para uma reflexão séria e pragmática a fim de se buscar a saída da mais profunda caverna de onde a educação brasileira se entrincheirou para, então, analisar qual melhor destino seguir…

Dr Bento J Abreu

Editor do site, professor, pesquisador e interessado em assuntos atuais

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