
Se o medo da morte é realmente a base de todos os medos, sua representação deve ser bem antiga. Nesse contexto, o esqueleto humano como simbologia da morte é bastante peculiar pois é algo que “faz parte dos vivos assim como dos mortos”.
Inicialmente, a morte era simplesmente representada por um cadáver em estado de decomposição. Foi a partir da Idade Média que surgiu a personificação mais popular da morte, envolvendo a figura do “Ceifador” – um ser de aparência fantasmagórica e pálida que, montado a um cavalo, podia facilmente decapitar um indivíduo com sua longa foice. Acredita-se que tal representação tenha sido influenciada pelo livro das revelações da Bíblia, no qual a morte seria um dos quatro cavaleiros do Apocalipse que viria ao mundo anunciar o julgamento final. Com o passar do tempo, a imagem do Ceifador foi sendo substituída por um ser esquelético.
Na mitologia grega , o próprio Caronte – o barqueiro responsável por levar as almas para Hades – pode ser representado como um velho ou um esqueleto parcialmente coberto por manto e capuz. Ainda, em decorrência da Peste Negra que vitimara milhões de indivíduos no fim da era medieval, representações de esqueletos juntando-se aos vivos numa verdadeira “dança macabra” (Figura 1) mostravam a morte como o destino final de todos.

Mas quando a representação do esqueleto como símbolo da morte tornou-se arraigada na cultura ocidental? Segundo o colega anatomista Juarez Chagas, em seu recente livro – “A morte e suas Representações”, foi a partir da expansão das dissecações anatômicas no início do período renascentista que houve uma verdadeira transformação na forma de se representar a morte. Nesta temática, Andreas Vesalius e sua obra-prima De Humani Corporis Fabrica tiveram papel fundamental.
As brilhantes ilustrações de Kalkar e as dissecações públicas promovidas pelo anatomista belga apresentavam o cadáver humano como ferramenta indispensável para o progresso científico. Interessantemente, na página-título do livro podia-se observar um esqueleto humano em posição anatômica segurando uma longa foice, e tal imagem também foi representada por Robert Thom posteriormente (Figura 2). Tal simbologia da morte persistiu na civilização ocidental e os esqueletos humanos podiam então ser profusamente encontrados em universidades ou mesmo nas paredes de capelas e igrejas, sendo considerados perfeitas representações da finitude humana.

É importante ressaltar que a própria representação do demônio como o agente da morte também podia ser encontrada desde a Idade Média. O diabo ou Lúcifer, o anjo caído, poderia assumir qualquer forma, seja de animais ou pessoas.
Dr Bento J Abreu
Editor do site, professor, pesquisador e interessado em assuntos atuais
Referências:
Chagas, Juarez. A morte e suas representações. 1. ed. – Jundiaí, SP: PACO, 2018.
http://acourseindying.com/death-personified-the-many-appearances-of-death. Acessado em 15/11/2018.
Olá, professor Bento e toda equipe.
A muito tempo ouvi falar que a anatomia/medicina teve bastante evolução com ás experiências macabras dos nazistas com os seus prisioneiros. Até onde isso é verdade?
Nunca achei nada escrito. Podem escrever algo sobre?
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Olá Berg! Alguns experimentos foram sim realizados em regimes totalitários e, inclusive, utilizaram humanos como cobaias. Não obstante, configuram uma exceção à regra e não podem ser representativos da evolução médica no século XX. Você pode encontrar mais detalhes em “Curiosidade Mórbida” (Mary Roach) e “A assustadora história da Medicina”. Abraço!
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